Para todos os santistas
Foi difícil. Assim como tudo que é muito bom tem que ser. Ao apito final do jogo entre Santos e Peñarol, do dia 22 de junho de 2011, a torcida do Peixe pôde finalmente comemorar aquilo que não comemorava há 48 anos, o título da Copa Libertadores da América. No Pacaembu, as pessoas ao meu redor choravam, sorriam, se abraçavam e logo depois estavam todas atônitas. Pareciam não acreditar no que tinha acabado de acontecer. Tudo bem que já estamos acostumados a grandes conquistas e nos últimos 10 anos comemoramos mais títulos do que a maioria dos clubes brasileiros. Mas a copa sul-americana é diferente. É um título que não vinha desde os tempos em que Pelé jogava.
Foi difícil para os torcedores. Acreditamos e sofremos a cada jogo. Perdemos a final para o Boca Juniors de forma lamentável em 2003, mas dessa vez o time era melhor e (por incrível que pareça) mais maduro e preparado. Esse ano estávamos confiantes por vários motivos. O Santos foi a grande sensação de 2010, trazendo uma geração de jogadores que só mesmo o próprio Santos teve igual (com Pelé, Coutinho e Pepe), na década de 60. Mais motivos: Temos o melhor jogador do mundo na atualidade – Neymar – e um técnico vencedor – Muricy Ramalho – que ainda não tinha esse campeonato em seu currículo. Também no elenco estavam vários jogadores que tinham deixado escapar o título em outras oportunidades: Elano e Léo (pelo Santos), Arouca (pelo Fluminense) e Durval (pelo Atlético-PR).
Lembro onde estava em cada partida da maravilhosa campanha do Santos. Estava no Chile, no estádio Monumental, na única derrota do Santos na competição, para o Colo-Colo, e não pude ir à Vila Belmiro no jogo de volta. Por motivos pessoais estava em São Paulo, assistindo em um bar - cuja principal atração era o “importantíssimo” jogo entre São Paulo e Santa Cruz pela Copa do Brasil. A vitória santista com direito à máscara de Neymar, expulsões e sufoco por precisar dos 3 pontos a qualquer custo, só foi vista por mim depois que pedi para o garçom sintonizar no jogo, na tevê ligada em frente à minha mesa (depois fui acompanhado por outro santista fanático e seu grupo de amigos).
Lembro dos sustos que foram as primeiras partidas. Um empate contra o Deportivo Táchira na Venezuela – assistido no Quitandinha, em São Paulo, com uma multidão de alvinegros desapontados, esperando show do Santástico logo na estreia. E outro empate contra o Cerro Porteño, dessa vez na Vila Belmiro – assistido na casa de um velho amigo, companheiro de cachaças ao longo de grande parte dessa Libertadores. Foi dureza. Estávamos quase eliminados e parecia que a única vez que tínhamos a oportunidade real de vencer esse campeonato – e jogando como Santos, ou seja, dando show e fazendo o futebol arte – iria por água abaixo.
Tudo mudou com a vinda de Muricy. Aquele Santos que dava espetáculo e vencia de 8, 9 e até 10 gols no ano passado amadurecia. Precisava se fechar. Um time que faz tantos gols está sempre jogando aberto (e consequentemente está vulnerável). O novo técnico conseguiu isso. E o Santos das goleadas de dois dígitos, como aquele dos anos 60, agora ganhava de meio a zero. E estava bom. Nas oitavas ganhamos do América do México de 1 a 0 e seguramos o 0 a 0 no jogo de volta (graças ao santo goleiro Rafael). Nas quartas aconteceu o mesmo contra o Once Caldas, da Colômbia. 1 a 0. 1 a 1. Vale lembrar que esses dois times foram “carrascos” do Santos em outras edições da Libertadores dessa década, nos eliminando em 2008 e 2004.
Inesquecível também foi a rodada das oitavas de final em que todos os times brasileiros da competição – exceto o Santos, lógico – foram inexplicavelmente eliminados. Internacional, Grêmio, Fluminense e Cruzeiro (que muitos davam como favorito) deram adeus, deixando o alvinegro praiano como único representante do nosso país na Libertadores.
Para melhorar a situação, o avanço do Santos na competição coincidiu com as gravações de um curta-metragem que estou fazendo sobre o Peixe, algo que me deu a oportunidade de fazer novos amigos (que deixaram de ser apenas simples entrevistados) por conta de nossa paixão em comum. Assistimos juntos aos jogos finais, trocamos ideias sobre o que era ser criança e torcer para o Santos nos anos 90, época de muito sofrimento futebolístico. Vimos Pelé Eterno depois do jogo contra o Cerro Porteño, que nos classificou para a finalíssima. Já imaginávamos que estávamos prestes a comemorar aquele título que antes só tínhamos em preto-e-branco nos vídeos. A história estava, mais uma vez, sendo escrita na nossa frente
- Imagina, nós vamos ver isso agora!
O nosso novo Pelé atende pelo nome de Neymar. Um ídolo de moicano, que não perdoa os adversários. Moleque que ama o Santos e bateu no peito dizendo que ficava no nosso time depois de receber proposta “irrecusável” do Chelsea da Inglaterra. Homem de personalidade e atual melhor do mundo, falta apenas a FIFA reconhecer, façanha que pretende conquistar jogando no Brasil. Esculacha dentro e fora de campo.
Tudo conspirou à favor da beleza desse título. Até porque nada no Santos é meia-boca. Tudo é histórico. O adversário da final seria o Peñarol, mesmo time que vencemos em 1962 para a primeira conquista da América.
Depois de ter chorado tanto com times sofríveis, vimos o Santos voltar a ser o gigante que sempre foi com a conquista do Brasileiro de 2002 e muitas outras que vieram depois. Como disse um amigo, uma geração inteira foi vingada na quarta-feira, 22/06/2011.
Durante muitos anos nossas maiores alegrias eram ver o Santos golear o Corinthians com aqueles gols sensacionais do Guga, ver o Giovanni destruir em campo e ver um título de Rio-São Paulo (97) em cima do Flamengo e um de Copa Conmebol (98) em cima do Rosario Central.
Tudo isso acabou naquele jogo diante de um Pacaembu lotado. Nunca mais seremos chamados de “viúvas de Pelé”. Sempre seremos o único time que parou uma guerra. O maior time da terra.
E o Peñarol? Vencemos mais uma vez. Foi difícil. Mas foi na bola.
Obrigado, Santos. Eu te amo.